A temida seca – Sua fazenda já desceu o trem de pouso?
Com a redução de margem que a pecuária sofreu nos últimos anos o custo fixo se tornou o grande vilão da lucratividade em todos os sistemas de produção e em todas as regiões do país, conforme o Benchmarking da Inttegra demonstra ano após ano.
Neste cenário a elevação na produção de arrobas por hectare é fundamental para diluir os custos fixos e possibilitar melhor margem para lucro. A média brasileira fica em torno de 3 @/ha/ano, isto é, um faturamento de 400 a 500 reais/ha/ano para pagar todo o custeio, investimentos (quando essas fazendas investem!) e obter lucro.
A elevação na produtividade para valores acima de 7 @/ha/ano já muda o patamar da propriedade e, geralmente, o ciclo de degradação se encerra para dar início à um ciclo de edificação, ou seja, a fazenda está melhor a cada safra.
A produção de arrobas em uma fazenda se faz pelo produto de dois fatores: de um lado temos a taxa de lotação, a qual irá determinar a quantidade de animais presentes na propriedade, e de outro temos o desempenho individual desses animais, isto é, o quanto cada animal está produzindo. Quanto mais animais se tem na fazenda e mais cada animal produz de carne (via ganho de peso diretamente ou via kg de bezerros desmamados), mais arrobas por hectare se produz, conforme demonstrado na figura 1.
Figura 1. Desempenho individual e taxa de lotação afetando diretamente a produção de arrobas por hectare da fazenda.
Existem diversas formas para elevação da taxa de lotação e do desempenho animal. Algumas já estão bem consolidadas, como a IATF, e outras ainda são utilizadas de forma nem sempre adequada, geralmente tecnologias nutricionais, resultando em aumento na produtividade, porém com elevação significativa de custo o que pode não melhorar a margem de lucro.
As opções nutricionais são excelentes e permitem um cardápio vasto de protocolos que dão boa flexibilidade e viabilizam diversos projetos, inclusive de pasto, Brasil a fora. No entanto, quando a nutrição é utilizada para tampar uma ineficiência produtiva a pasto o processo começa a ficar perigoso.
Por outro lado, o investimento em melhoria do manejo do pastejo não é uma tecnologia “insumizadora” por focar em colher melhor o que JÁ está produzido na fazenda, portanto, não apresenta elevação significativa no custeio, e apresenta grande potencial de aumento de taxa de lotação e no desempenho individual dos animais.
Este potencial é grande devido à baixa eficiência que o manejo de pastagens subjetivo (“PASTO TÁ BOM, PASTO TÁ RUIM”) empregado atualmente, o que resulta na maioria dos casos no 8 ou 80, ou seja, em pasto batido e pasto passado.
Pasto batido e pasto passado suportam baixa taxa de lotação por apresentarem pequeno acúmulo de forragem durante o ano, além de propiciar baixa desempenho animal uma vez que os animais andam muito pastejando 1:30 hora a mais por dia, e ingerem menos capim (4 a 5 kg de capim/dia a menos).
O que acontece com quem anda muito e come menos? No caso dos bovinos de corte, ganham menos peso e apresentam menor escore corporal para inseminação. Baixo desempenho individual somado à baixa taxa de lotação resulta em pequena produção de arroba por hectare.
Para que se tenha a POSSIBILIDADE de realizar um bom manejo de pastagens durante a safra é necessário um certo equilíbrio entre oferta e demanda de capim durante o ano safra todo.
Portanto, um planejamento forrageiro bem feito é fundamental para anteciparmos o potencial das águas e a demanda da seca e, assim, traçarmos estratégias CALCULADAS técnica e financeiramente que busquem eficiência no manejo do pastejo.
No entanto, como o que mais se tem pelo país são manejos subjetivos, pouco de conhecimento sobre os processos de produção a pasto e falta completa de números para gerenciar pastagens, ocorre um MEDO excessivo da SECA levando a fazenda ser passada o que, como vimos acima, é muito ruim. 7 em cada 10 diagnósticos de pastagens que fazemos na Gerente de Pasto as fazendas se encontram com 50 a 60% do rebanho que poderiam ter.
O primeiro passo para entender suas pastagens é transformar seu pasto em números. Não necessariamente kg de matéria seca de capim/ha, mas números mais inteligentes que permitem maior dinamismo no manejo do dia a dia, por não demandarem cortes de capim, ao mesmo tempo que são que propiciem boa eficiência no manejo do pastejo.
Nós da Gerente de Pasto propomos uma metodologia de monitoramento sistemático (a cada 30 dias) e global (em 100% das áreas de pastagens) das pastagens que utiliza como métrica base a taxa de lotação ocorrida (UA/ha) em cada área de pastagem da fazenda. Assim, pela relação causa (UA/ha ocorrida) e efeito (condição no dia do monitoramento) no pasto, “desmamamos” dos cortes e mensurações para determinar oferta de forragem em 2013.
O segundo ponto é aceitar e entender a intensidade da seca e como ela afeta a redução da capacidade de suporte das pastagens. Com relação a intensidade da seca temos que ter em mente que a necessidade de redução na taxa de lotação no pico de seca deve ser de 50 a 60% quando comparamos com o pico de águas.
Então, se a fazenda apresenta capacidade de suporte de 2 UA/ha nas águas, ela terá capacidade de suporte nas pastagens de 0,8 a 1,0 UA/ha no pico da seca. Analisando os números nota-se que a manobra de seca não é brincadeira.
Aquelas 7 em cada 10 fazendas que iniciamos um trabalho são passadas porque as águas passam com a lotação que cabe na seca, justamente apresentando 50 a 60% da capacidade total de rebanho na fazenda, e uma pequena manobra (venda de desmama e/ou vaca descarte) já traz a lotação para níveis de seca.
Nessas fazendas passadas a eficiência de pastejo é baixa uma vez que os pastos entalados são pouco consumidos nas águas e menos ainda na seca, resultando no cenário da foto abaixo (figura 2): final da seca e o capim está no chão ou em pé, enquanto deveria ter entrada na “barriga do boi” para virar carne.
Se não foi consumido não virou carne. Se não virou carne não teve faturamento e todo aquela “SOBRA” de capim para a SECA na verdade, é uma sobra FALSA, ILUSÓRIA, porque o animal não consome.
Figura 2. Capim (Xaraés/MG-5) não consumido em Nova Crixás – GO em final de setembro de 2014.
Amigo leitor, aí você pode pensar: Exploro bem a capacidade de suporte nas águas, não passo sufoco na seca e não realizo essa manobra de redução de 50 a 60% do meu gado em pastagens. Te digo, você está certo.
Acontece que na prática fazendas que exploram bem suas pastagens nas águas estão com 80 a 85% da capacidade de suporte da fazenda. Esta sobra, se bem gerenciada, permite que a fazenda acumule estoque de capim de boa qualidade como um todo, pastos passados de forma excessiva.
O estoque acumulado nas águas é parcialmente consumido na seca permitindo que a taxa de lotação esteja ligeiramente acima da capacidade de suporte para agosto, setembro e outubro. A figura 3 contém um pasto de Brachiaria brizantha cv Marandu (Braquiarão) que foi bem manejado nas águas e está tendo seu estoque consumido durante a seca.
Figura 3. Capim (Braquiarão) com boa estrutura em Araguaiana – MT em final de agosto de 2018.
Analisando a foto acima vemos claramente como essa estrutura de capim é folhosa e apresenta desperdícios mínimos, isto é, a eficiência de colheita do capim pelo animal é ótima resultando em maior desempenho individual (melhoria nas taxas de prenhes e maior ganho de peso diário).
Resumindo, utilizar 80 a 85% da capacidade de suporte das águas permite realizar manejo do pastejo com boa eficiência (ofertar folhas para o animal colher) ao mesmo tempo que se acumula estoque forrageiro para a seca. Este estoque extra, por sua vez, possibilita que a taxa de lotação na seca seja ligeiramente superior a capacidade de suporte. Portanto, a manobra de rebanho em pastagens para a seca acabado ficando entre 30 a 35% do rebanho.
Considerando o mesmo exemplo da fazenda acima, de capacidade de suporte de 2 UA/ha nas águas e 0,90 UA/ha na seca, na prática teríamos a fazenda com 1,70 UA/ha nas águas e 1,10 a 1,15 UA/ha nas pastagens no pico de seca.
A manobra se dá via abate de animais terminados, venda de desmamas, abate de animais descartes, utilização de semiconfinamento, confinamento, boitel, enfim, o cardápio é vasto para realizar a manobra para seca.
Já sabemos o QUANTO temos que reduzir na taxa de lotação nas pastagens para a seca, agora vamos entender o COMO a redução na capacidade de suporte das pastagens ocorre.
Comumente a turma imagina que a fazenda vem com 2 UA/ha até final de abril ou maio e em junho já teria que estar com 1 UA/ha. Não é assim que funciona, a redução na capacidade de suporte não é abrupta e sim gradativa, conforme demonstrado no gráfico X.
Portanto, fazenda que explora bem seus pastos nas águas deve iniciar o “procedimento de pouso” já em abril. Em junho/julho o trem de pouso tem que estar abaixado porque agosto, setembro e outubro (dependendo da região) teremos a menor capacidade de suporte de todo o ano, ou seja, é o piso/chão do potencial de lotação das pastagens.
Gráfico 1. Capim (Braquiarão) com boa estrutura em Araguaiana – MT em final de agosto de 2018.
Quando evoluímos o rebanho para projetar a safra vemos que a aplicação de estratégias nutricionais e estação de monta curta e cedo são fatores que permitem melhor exploração da capacidade de suporte das águas com consequente maior eficiência de pastejo, pois, a fazenda terá muitos animais e, principalmente, muitas UA saindo gradativamente das pastagens a partir de abril/maio tendo o menor estoque do ano safra justamente nos meses de pico de seca.
A nutrição impacta via abate de animais terminados ou aumentando o ganho de peso para que a recria seja finalizada até o pico da seca e os lotes possam ir para o confinamento, por exemplo. A estação de monta curta e bem definida permite desmamar mais animais no cedo acelerando a venda ou transferência dos mesmos, em caso de fazenda de cria, e permitindo engorda e comercialização das matrizes descarte antes de julho/agosto.
Notem como tudo o que foi exposto a partir do entendimento da intensidade de redução na capacidade de suporte que a seca aplica nos pastos e como ocorre a dinâmica dessa redução, foi referenciado em números.
Portanto, “pasto tá bom e pasto tá ruim” do seu capataz não contempla de forma alguma um bom planejamento forrageiro o que não levará, em absoluto, à boa eficiência de colheita do capim, a qual é fundamental para elevação da produção de arrobas por hectare que dilui custos fixos e aumenta a margem de lucro da sua pecuária.
Msc. Edmar Pauliqui Peluso
Mestre em produção animal com ênfase em pastagens e forragicultura - UEM
Sócio diretor Gerente de pasto
Equipe Gerente de Pasto
contato@gerentedepasto.com